Blasphemous 2 – Melhorar a levar porrada (Análise)

Já passaram quase 5 anos desde que cobri o primeiro Blasphemous com uma análise e acreditem quando vos digo que esse facto não está a entrar bem na minha cabeça. É estranho pensar que ando a escrever textos sobre videojogos – ou, como gosto de dizer: “mandar bitaites sobre videojogos” – há mais de meia década porque, para bem ou para mal, sinto que acabei de entrar nestas andanças. Isto não é queixume meu, não estou a dizer que “estou velho”, acho que seria desrespeitoso para os meus colegas de outras publicações que fazem isto há muito mais tempo e com muita melhor qualidade que eu. É um simples desabafo sobre a bofetada que levei ao ver a data da minha análise ao Blasphemous quando me estava a preparar para escrever este artigo. Bem, de qualquer modo, passemos ao que importa.

No início do ano prometi a mim mesmo que não só ia escrever mais, como ia tentar cobrir mais indies (ainda que a definição de indie esteja mais turva que sempre), e Blasphemous 2 é um bom indie para começar o ano.

Quem me conhece sabe que sou fã de Metroidvanias, é fácil perceber porquê, com jogos como Super Metroid, Metroid Zero Mission, Ori and the Will of the Wisps ou Hollow Knight a constar na minha lista de jogos favoritos de sempre, é um género que me apela facilmente e ando de olho no novo Prince of Persia mesmo por essa razão. Não é difícil ficar agarrado a este tipo de jogos, puxam pelo nosso faro para a exploração, conseguem ser extremamente satisfatórios, seja no combate ou movimento, e deixarem-nos a nossa perícia através do gameplay e, acima de tudo, têm um sistema de progressão e ritmo gratificante. Estou a enumerar isto porque o Blasphemous 2 assinala todas estas caixas de pontos ambíguos que eu uso para definir um Metroidvania e é um jogo que quase alcança o nível da minha lista de favoritos, mas falha em alguns pontos.

Voltamos a vestir a armadura do Penintent One – vários anos depois dos eventos do DLC Wounds of Eventide (que não tive a oportunidade de jogar) – para impedir o Milagre, a maldição do primeiro jogo, de renascer. A iconografia e folclore hispânico continua a ser o foco artístico da The Game Kitchen e, tal como no primeiro jogo, o estúdio arrasa na direção artística com pixel art detalhada e grotesca, o mundo desolado de Cvstodia salta à vista com as suas paisagens desertas e os colossos castelos góticos (talvez até neogótico, a minha falta de conhecimentos de arquitetura limita-me aqui), povoados por criaturas monstruosas ou personagens gigantes saídas duma pintura de Goya; a atmosfera de Blasphemous 2 é forte, pesada e digna do nome. Gostei de explorar este mundo, descobrir os seus cantos e recantos, muito porque adoro estas interpretações e tradução de mitologia cristã num mundo de videojogo com influências claras de obras como Dark Souls ou Castlevania. Acho que foi executado muito bem no primeiro jogo e aqui, e gostava de ver mais jogos a adaptar um mundo assim (incluindo da própria From Software).

Ainda assim, há algo em Blasphemous 2 que eu chamaria de berrante e não parece encaixar no estilo artístico do jogo: as cutscenes animadas. Em vez de continuarem com as cutscenes em pixel art do primeiro jogo, fizeram-nas mais aproximada a um estilo – e desculpem-me pela falta duma descrição melhor – de animação japonesa, algo mais limpo e que assim que se apresenta no ecrã deixou-me a olhar de lado a questionar a decisão estranha que simplesmente não ressoou comigo. Individualmente não têm nada de mal, é mesmo a falta de coesão em relação ao resto do jogo e pareceu sempre estar fora do sítio, como se fosse uma obra à parte ou um material promocional.

O protagonista teve umas melhorias no que toca aos controlos e combate. O platforming já não é tão frustrante como anteriormente, e agora até temos mais opções de movimento, o Penitent One vai ganhando mais transversalidade com as novas habilidades, com mais dashes o jogo torna-se mais rápido e satisfatório. As armas novas não só dinamizam muito mais o combate como revelam novas formas explorar o mapa, como utilizar uns espelhos que vos teleportam dum lado para o outro ou um ataque aéreo que destrói barreiras previamente impenetráveis. Não encontrei o mesmo nível de movimento fluído e desafiante que o Ori oferece, mas houve zonas do mapa onde depois de completar o desafio de plataformas fiquei “Ok, isto foi fixe.“. E o combate segue o mesmo caminho, agora com mais variedade de ataques e inimigos, há aqui alguns bons momentos de cortar o fôlego. Tenho pena que tenham reduzido a importância do parry, era das mecânicas mais satisfatórias de executar no primeiro, e aqui, apesar de ainda existir, senti que não tinha o mesmo peso nos encontros com bosses, na maior parte do tempo, devido à aceleração do combate, os bosses eram muito rápidos e atacavam com muito mais frequência, o que tornava a evasão mais segura e eficaz, e o parry não tem uma recompensa digna do risco.

A adição dum arsenal mais variado também trouxe mais problemas. Das três armas que têm ao dispor: Ruego Al Alba, a mais próxima da espada original do primeiro e a mais equilibrada; Veredicto, uma espécie de malho gigante que dá mais dano mas é muito mais lento; E Sarmiento and Centella, uma espada e adaga extremamente rápidas mas fracas. Eu comecei o jogo com o Veredicto, e, assim que ganhei o Ruego Al Alba, passei a usar essa espada em 90% dos meus encontros. O Veredicto, apesar do dano, era extremamente lento, e na maior parte dos combates (mais uma vez, o combate é mais rápido neste jogo) deixava-me exposto e não compensava o dano. Já a espada e adaga simplesmente não eram satisfatórias de usar porque a sensação de impacto sentia-se ao equivalente de oscilar duas toalhas molhadas contra uma estátua de ferro. Então, o Ruego Al Alba sempre foi mais satisfatório pela versatilidade que oferecia, era rápido o suficiente para executar combos completos e dava dano para compensar, sobretudo depois de o melhorar e desbloquear a habilidade especial, que permite com que sacrifique um pouco de HP para dar dano extra e recuperar HP consoante o dano infligido. Esta falta de equilíbrio, em conjunto com a desvalorização do parry, fez-me sentir saudades do primeiro Blasphemous em momentos.

Tal como o Penitent One, eu penei bastante neste jogo, houve bosses que me fizeram tremer e suar, bosses como o Odon, Eviterno ou Sinodo, onde perdi a conta das vezes que o ecrã de Game Over me confrontava, e com cada um eu tinha vontade de amaldiçoar o jogo, eu insultava o boss após várias tentativas e quando finalmente o derrotava, era o maior da minha aldeia e “a partir daqui já ninguém me para”. Contudo, nenhum deles me fez odiar tudo e todos como a Benedicta: um boss onde tens de lutar enquanto saltas entre duas plataformas, e o meu maior teste de paciência durante as 15 horas neste jogo. Irónico, na discussão que via sobre o jogo, não encontrei muitas queixas sobre esta luta, a maior parte focava-se no Eviterno (que, aliado à fantástica banda sonora de Carlos Viola, é uma boss fight excelente, já agora), mas a Benedicta fez-me questionar se tinha paciência para continuar a jogar, talvez saltar entre plataformas flutuantes enquanto luto seja o meu tornozelo de Aquiles, ou então era o mini bullet hell que o boss fazia, ou ainda não tinha mestrado o dash e double jump por esta altura, mas estava mesmo a praguejar todo o tipo de palavrões ao boneco flutuante, até que, quando finalmente o derrotei, fui respeitosamente queixar-me no Twitter/X. Dito isto, enfrentaria outra Benedicta neste jogo, o meu ponto final é que, apesar de me frustrar, o desafio e satisfação que o jogo oferece vale a pena, e isto não é o mesmo tipo de frustração que senti com, por exemplo, o boss final catastrófico do Sonic Superstars.

Não fiz o 100% do Blasphemous 2, nunca o faço neste género de jogos, normalmente fico satisfeito com o final que me calha, depois de 15 horas tinha pouco mas ainda algo para fazer: apanhar o resto dos colecionáveis, acabar as side quests e ver os outros finais. Se gostam disso, o jogo ainda é capaz de vos durar até às 20 horas, dependendo do quão bons são no jogo.

Recomendo altamente o Blasphemous 2 aos fãs de Metroidvania, caso tenham jogado o anterior, esta sequela alcança as expectativas com o seu combate, movimento e exploração satisfatórias e a sua pesada atmosfera é tão brutal como memorável. Vão tremer, vão sentir a adrenalina ao lutar com os bosses de Blasphemous 2, e vai valer o esforço. 8 em 10.

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