Like a Dragon: Infinite Wealth – Análise

Já estou a fazer um destes outra vez! Ainda há dois meses publiquei a minha análise ao Like a Dragon Gaiden: The Man Who Erased His Name mas a RGG Studio dispara jogos do forno mágico deles mais rápido do que eu consigo escrever uma análise. Like a Dragon: Infinite Wealth é o seu terceiro jogo lançado no espaço de um ano (os outros dois sendo Gaiden e Ishin!) e – spoilers – provavelmente o melhor deles.

Infinite Wealth está disponível para PlayStation 4, PlayStation 5, Xbox One, Xbox Series S/X e PC ao preço do costume. No entanto, se são o tipo de jogadores que dão uso ao New Game Plus nos vossos jogos, terão de ceder à ideia completamente ridícula da SEGA de pagar 15€ extra para ter acesso ao modo, eu não costumo rejogar os jogos com isso, mas não deixa de ser triste ver um modo tão básico bloqueado atrás da edição Deluxe, e oxalá isto não se torne norma. De qualquer forma, siga para a análise.

Cópia do jogo cedida pela Ecoplay. O Diogo Arez juntou-se a mim para partilhar os seus pensamentos sobre o jogo como apoio para escrever esta análise.

Ichiban está de volta, e com ele, o combate por turnos de Yakuza: Like a Dragon. Há melhorias significativas em relação ao jogo anterior, como utilizar o movimento e espaço a nosso favor (um pouco ao estilo da saga Xenoblade), seja para empurrar inimigos contra outros inimigos ou para criar combos com os membros da nossa party, funciona como uma muito necessária nova camada de estratégia no combate e torna-o mais dinâmico, conseguimos utilizar estas vantagens para, por exemplo, espremer mais dano da nossa party com um ataque extra. Uma das minhas maiores queixas em relação a Yakuza 7 era em relação a esta questão tática, pois na fase final do jogo, a melhor estratégia para mim acabou por ser: abusar das fraquezas de tipo dos inimigos e abusar do guard para não morrer num ataque. Nunca recorri a isto em Infinite Wealth, e felizmente nunca senti a necessidade de fazer uma das coisas que mais me frustram em JRPGs: grind. Todavia, estas adições que aceleram o combate trazem alguns problemas, nomeadamente os movimentos da câmara, que perde-se a tentar acompanhar a acção e por vezes custa-nos um pouco de HP quando nem conseguimos reagir aos ataques dos inimigos.

De tudo o que há de novo no combate de Infinite Wealth em relação a Yakuza: Like a Dragon, argumentaria que não há maior adição que o Kiryu. A tentativa de traduzir o protagonista original da série de acção em tempo real num cenário de combate por turnos foi executada sensacionalmente. Like a Dragon como um JRPG sempre foi mais interativo que alguns dos seus equivalentes – por exemplo Persona ou Dragon Quest – por pedir mais agência do jogador durante os ataques e defesas com o block e quick-time events, mas o Kiryu destaca-se com os seus três estilos de luta diferentes e poder, literalmente, quebrar as regras de turnos e encher o campo todo de porrada como se tivesse voltado aos jogos que protagoniza, e a satisfação que sentem ao segurar R2 para mostrar a um boss difícil como é que o “Dragão de Dojima” passava o tempo em Kamurocho não tem rival aqui.

Há sempre alguma estratégia a ter em conta neste tipo de jogo: dar bom uso aos buffs de equipa e escolher bem os ataques tendo em conta a fraqueza do inimigo e os efeitos especiais que vão causar é o ideal, sobretudo se jogarem na dificuldade mais alta. Mas eu acabo por ceder sempre aos “maus hábitos” que pratico desde miúdo e que jogo Pokémon ou outros JRPGs: que é “malhar no tipo até ele cair”, funcionou antes, funciona aqui, onde Yakuza 7 era frustrante por me obrigar a fazer grind e abusar de block mais vantagens de tipo, Infinite Wealth é menos desafiante. O Diogo achou este jogo estupidamente fácil e eu tendo a concordar com ele. Pessoalmente, prefiro esta abordagem, mas não deixei de sentir a falta de estratégia (ou algo que puxe por ela) que reflita a habilidade do jogador, e o Diogo acabou por encontrar mais entretenimento no quão longe podia ir com o dano das suas personagens do que no próprio desafio do jogo. Talvez tenhamos jogado na dificuldade errada, ou talvez eu tenha simplesmente jogado mal, ou então o jogo não conta com o conteúdo extra que podem fazer entre as missões e não está preparado para isso. Não obstante, acabou por ser divertido, mas em nenhuma altura estava a fazer as dungeons e a lutar contra ondas de inimigos a pensar “Adoro isto, quem me dera que este nível tivesse mais 10 andares para eu poder usufruir deste combate!“, antes pelo contrário.

Dungeons e combate à parte, não falta conteúdo em Infinite Wealth – eu sei, “Muito conteúdo? Num jogo Yakuza/Like a Dragon? Quem diria!” – mas é sempre bom reafirmar que, se estão fartos do combate ou do enredo principal, têm todos estes minijogos para quebrar a monotonia e o ritmo do jogo. Desde um clone do Crazy Taxi, a um clone de Animal Crossing, a um clone de Pokémon, há aqui uma seleção de minijogos ridículos e familiares que vos vão durar horas, e possivelmente acompanham-vos pela campanha toda, esta coletânea de histórias e passatempos secundários foram a parte favorita do Diogo e entendo perfeitamente porquê. O jogo de Sujimons (clone de Pokémon) foi onde passei mais tempo, sempre a combater outros treinadores que encontrava pelo mapa, a apanhar todos os Sujimons que conseguia e treiná-los e evoluí-los, e mesmo assim só devo ter feito metade daquilo nas minhas 80 horas no jogo. Não peguei tanto no conteúdo da Dondoko Island (clone do Animal Crossing), mas é mais um buraco negro para o vosso tempo de jogo. E podem esperar a típica comédia das substories que acabam em melodrama ou ainda mais comédia.

Honolulu é a nova cidade introduzida por Infinite Wealth e a primeira vez que temos uma cidade não nipónica como foco dum jogo nesta série. Como disse em cima, conteúdo aqui não falta e o jogo até explora os temas e problemáticas do Havai a certo ponto, mostrando as dificuldades do povo nativo em lidar com as consequências do capitalismo e turismo no país, sobretudo no que toca à crise de habitação, onde a classe pobre é quase literalmente varrida para os cantos escondidos da cidade, vivendo em bairros de crime elevado. Há todo um distrito decadente separado do resto da cidade solarenga e azul. Estes temas acabam por ser postos um bocado em segundo plano com o desenvolvimento do enredo, e a meu ver, é só parte da razão pela qual a narrativa de Infinite Wealth se perde um bocado pelo meio.

Vou tentar deixar os meus pensamentos sobre a história sem entrar muito no campo de spoilers, no entanto, se querem ir completamente cegos para o jogo, aconselho saltarem os próximos três parágrafos:

O Diogo resumiu a narrativa da seguinte forma: “O conceito é interessante, isso sem dúvida, mas a execução deixa bastante a desejar a todos os níveis, não só durante grande parte dos capítulos a história simplesmente não avança do mesmo objetivo básico, como pelo fim começaram a dar-me a sensação que as ideias foram escritas por equipas diferentes e coladas à última da hora.” Acho que ele reflete o pensamento geral que tenho em relação à artimanha que é o enredo de Infinite Wealth, e a segunda metade do jogo é a razão principal:

A certa altura a party é dividida em duas, onde um dos protagonistas, Ichiban, fica no Havai para tentar encontrar a sua mãe, fugitiva e vítima dum plano político por parte de figuras poderosas em ambos o Havai e Japão – mais uma vez, estou a tentar manter isto livre de spoilers – enquanto Kiryu volta a Ijincho para lidar com um grupo de Yakuza com ligações a este plano. Esta separação de protagonistas, é a meu ver, onde a narrativa começa a tropeçar. Defendo que, para todos os efeitos, isto devia ter sido uma história do Ichiban. Em vez disso, o que tivemos foram duas histórias abarrotadas à força num jogo só, onde esta história, cujo objetivo final seria explorar o Ichiban e assentá-lo como novo protagonista para o eventual passar da tocha, acaba por ser ofuscada pela própria história de Kiryu. Onde a segunda metade do jogo começa a deixar o Havai para trás e deixa-nos de volta ao Japão com um intuito: dizer um adeus final ao velhote (quem viu os trailers do jogo sabe exatamente porquê). E atenção: eu quero dizer-lhe adeus, é um dos meus protagonistas favoritos de sempre, e em várias partes senti-me emocionado e receoso, questionei-me várias vezes se estava pronto, ao ponto de perder o meu investimento no enredo de Ichiban. Isto foi um erro por parte da RGG, e como se não bastasse, eles devotam-se a este erro ao ponto de, muito literalmente, fazer um dos vilões esquecíveis desvalorizar todos os esforços de Ichiban no Havai no final do jogo com uma simples declaração. Há toda uma falha em levar a própria história a sério, ao ponto até de ignorar consequências e até a ignorar os acontecimentos ao longo do jogo só para tentar forçar “momentos”.

Assim levanto a questão: visto que a RGG e a SEGA tornaram esta série anual, qual é a necessidade de termos fundido duas histórias com objetivos diferentes nesta Quimera mal amanhada que desvaloriza um dos objetivos em prol do outro? Como é que pode haver uma “passagem de tocha” se o protagonista antigo é que ofusca o protagonista novo? Não seria mais eficaz termos uma história que nos preparasse para dizer adeus e outra para assentar Ichiban definitivamente como protagonista? A execução deixa a desejar.

Posto isto, apesar da nossa amargura, há aqui algo delicioso: os membros da party e a interação entre eles. O simples ato de passear pelo mundo despoleta novas conversas que revelam pequenos detalhes sobre cada uma das personagens e deixaram-me com um sorriso na cara, seja pela sua patetice ou pela simples e engraçada troca de palavras, como ver a Seonhee ser a maior fã do Kiryu, ou o Namba a dizer as coisas mais ridículas que já ouvi, ajudam muito a dar aquela sensação importante de camaradagem no grupo. Eu estava investido nas personagens, e no final (numa metade do final, vá) fiquei satisfeito, fiquei nostálgico e fiquei pensativo; estou pronto para o que vem a seguir (Judgment 3, se faz favor).

Concluindo e resumindo, Like a Dragon: Infinite Wealth é uma sequela e meia do seu antecessor, Yakuza: Like a Dragon, com melhor combate e recheada de conteúdo. Mas com uma história que me frustrou, uma narrativa que não se decide o que quer realmente ser e acaba por desrespeitar-se a si própria e ao seu protagonista. Todavia, não deixem o meu desgosto para com a execução da narrativa destoar o que é outrora um jogo muito bom dentro da série. Não deixo de recomendar o jogo e atribuo um 7.5 em 10.

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