A série de survival horror da CAPCOM tem tido uns anos de sucesso recentemente. Com o Resident Evil VII e os remakes do Resident Evil 2 e 3 a serem lançados num espaço de três anos entre si, e todos a encontrarem sucesso comercial (embora o Resident Evil 3 fique um pouco atrás dos outros dois), era de esperar que a produtora apostasse nesta onda e trouxesse um título novo.
Resident Evil Village é uma sequela directa ao Resident Evil VII, e como tal, é um regresso ao protagonista Ethan Winters numa aventura em primeira pessoa em vez do típico estilo em terceira pessoa over-the-shoulder que temos tido desde o Resident Evil 4.
Resident Evil Village está disponível para PC, PlayStation 4, PlayStation 5, Xbox One e Xbox Series S/X. Esta análise foi feita com base numa cópia para a Steam, fornecida pela Ecoplay, à qual agradecemos.

Três anos depois dos eventos em Lousiana, Ethan vive calmamente com a sua esposa Mia, e a sua filha bebé Rose, até que são atacados por Chris Redfield, que rapta Ethan e Rose. Ethan acorda mais tarde no meio de um acidente de carro, perto de uma aldeia misteriosa com um castelo no seu topo e a sua filha desaparecida. O protagonista parte então em busca da sua bebé e encontra perigos e inimigos que provam que a casa dos Baker não foi a pior coisa pela qual ele terá de passar.
A narrativa do jogo consegue ter os seus momentos interessantes e excitantes mas como esperava, não eleva ou altera a fórmula da série, o que por um lado é bom: não se levando demasiado a sério acaba por não afectar negativamente a experiência do jogo e consegue servir mais como um condutor. Por outro lado, não achei nenhum momento particularmente memorável.
A performance de Todd Soley como Ethan Winters não me convenceu, se bem que grande parte da sua caracterização aqui são one liners que, no seu melhor, sacavam uma gargalhada da minha parte. Contudo, Neil Newborn como Heinsenberg e Maggie Robertson como Alcina Dimitrescu (“Tall Vampire Lady”) entregaram performances bastante sólidas e são o destaque entre as vozes e motion capture do jogo.

Quem viu os trailers já esperaria que Village fosse muito forte visualmente, e não está enganado, mas no meu caso, que esperava ser – e fui – deslumbrado pelos interiores extremamente detalhados do castelo, fui também surpreendido pelas paisagens e visuais da aldeia e arredores. O ambiente taciturno e frio de Transylvania completam a atmosfera inquietante do jogo, e mesmo que ache que não chegue ao nível assustador da casa dos Baker no Resident Evil VII (se bem que a casa Beneviento repleta de marionetas está bem perto disso), é sem dúvida uma boa execução.
Outra surpresa visual foram as animações, especialmente as dos inimigos. Para além de mais variedade, estes são muito mais dinâmicos, desviando-se dos nossos tiros e tropeçando pelo caminho para tentarem desesperadamente apanhar o Ethan. Não só tornam os inimigos mais (ironicamente) vivos, como torna o combate mais activo e menos “dispara na cabeça do bolor andante” que era o Resident Evil VII.
Tendo em conta o meu PC (Ryzen 3 1300X, GTX1060 6GB), o jogo corria maravilhosamente sem sacrificar o seu excelente aspecto visual. As poucas quedas de frames que tive ocorriam durante momentos do combate onde havia muita coisa no ecrã, mas não foram graves o suficiente para afectar a minha experiência. Para além da boa performance, há também muitas opções gráficas e de som para optimizarem o jogo ao vosso hardware, com detalhes sobre o impacto de cada opção no vosso computador e uma imagem a pré-visualizar as mudanças visuais no jogo. Em suma, a CAPCOM volta a trazer mais um excelente port para PC com o RE Engine e estabelece um padrão nos ports para PC entre os estúdios Japoneses.
Acrescento que o sound design está bem trabalhado, dando-nos uma boa percepção do espaço e inimigos, mas a banda sonora raramente me impressionou, e em vários pontos do jogo até entrava em dissonância com a acção (ou falta dela) no ecrã.

Tendo em conta a discussão que vi online por volta dos trailers de gameplay, houve várias comparações do rumo do Village ao mesmo que o Resident Evil 4 tomou. O jogo pareceu suavizar o aspecto de sobrevivência para se focar mais na acção. É verdade que, até certo ponto, há muitas semelhanças entre os dois jogos: a loja e melhoria de armas, o sistema de inventário e o facto dos Key Items e Valuables não terem peso no inventário do protagonista. Em todo o jogo nunca enchi o inventário, mas senti mais a falta de munição que no RE4. Gostava que houvesse mais opções no que toca à customização de armas, em vez de ser simplesmente algo linear de “arma nova é sempre melhor que a anterior”.
Manusear as armas é mais fácil agora – isto é justificado na narrativa porque o Ethan teve “treino militar” – e havendo mais variedade no arsenal também ajuda o gunplay a não se tornar repetitivo. Não obstante, senti muito mais impacto na diversão do jogo graças à variedade e comportamento dos inimigos, que mencionei acima, e ao level design que contribui muito mais para o combate que nos jogos anteriores. Quando rodeado por monstros na aldeia, podemos entrar dentro duma casa e barricar a porta para nos dar mais tempo de os abatermos ou fugirmos. Podemos disparar contra um saco de farinha para criar uma nuvem de distracção, ou usar barris explosivos para desfazer vários inimigos duma vez. Este elemento dos níveis nem sempre está presente, infelizmente – pois também seria mais difícil justificar sacos de farinha ou barris explosivos espalhados pelo castelo Dimitrescu – e devido a isto, o combate dentro do castelo e de outros interiores não é tão divertido como quando estamos na aldeia e arredores exteriores. Noto também que houve uma ou duas arenas onde combatíamos contra um grande número de inimigos enquanto corríamos dum canto para o outro só a tentar sobreviver que me lembraram de algo saído dum “arena shooter” como o DOOM, e nota-se que há ali uma boa base para expandir o combate da série. Tenho pena de não ter havido mais disto, mas ainda assim foram pontos do jogo bastante positivos.
Para a exploração, quem está familiarizado com a série sentir-se-à em casa aqui. Há muitas áreas para explorar e jogo favorece o olho atento com mantimentos e valuables escondidos em todos os cantos do mapa, até mesmo colados ao tecto. Os jogadores que saírem da rota da história principal para explorar tudo o que conseguirem poderão até encontrar tesouros e armas novas. O mapa ajuda, visto que todos os interiores que estiverem pintados de vermelho não estão completamente explorados, e assim que apanharem todos os objectos, a zona torna-se azul, assim assinalada completa. Para além disso, a certo ponto do jogo, o mapa marca todas os tesouros importantes (e opcionais) no mundo, e cabe aos jogadores procurarem por eles, ou ignorarem. Dito isto, tirando os tesouros opcionais, o jogo é mais linear do que aparenta, tendo em conta que há quatro zonas principais no mapa onde terão de ir para completar a história. Podiam tê-las construído de forma ao jogador escolher o caminho e ordem que desejava tomar, isto seria mais difícil de construir, sim, mas abria muito mais o mundo e dava mais liberdade ao jogador, em vez de ter de o guiar.
As duas vertentes onde senti que não estiveram à altura do seu predecessor foram os puzzles e bosses:
Em termos de puzzles, apesar de haver alguns bastante interessantes, a maior parte são básicos e limitam-se a ir buscar um objecto a outra zona e trazê-lo de volta. Os destaques são alguns puzzles opcionais onde tínhamos de procurar referências à nossa volta e uma sequência na casa Beneviento (e mesmo esse não é tão memorável como a “escape room” do RE7);
Os bosses também se tornaram mais simples, na sua maioria são apenas “disparar na cabeça até cair”, e só um ou dois (não quero deixar spoilers, por isso não refiro quais), é que iam (pouco mais) além disso. Um dos bosses consegue ser memorável pelo quão “over-the-top” e ridículo é, mas fora isso, não seriam a razão para eu revisitar o Village no futuro.
Numa última nota, senti que uma das últimas fases do jogo se esticou bem mais do que necessário, em 15 horas de jogo, o Village podia bem ter sido 2 ou 3 horas mais curto, e a minha experiência geral tinha sido mais positiva e menos enfadonha. Embora seja um ponto que consigo escrever dentro duma frase, é dos que mais me afectou a experiência negativamente. Esta fase é comparável à parte do navio no RE7, onde podiam ter chegado à conclusão da narrativa naturalmente, mas decidiram sacrificar o ritmo da história para estender a longevidade do jogo.

Em suma, Resident Evil Village é uma evolução do Resident Evil VII mais focada em acção, mas igualmente bem executada. O combate é mais dinâmico, a exploração é gratificante e a atmosfera e visuais conseguem ser sufocantes. Embora não melhore todos os aspectos em relação aos seus predecessores e volte a cometer o erro de esticar demasiado a duração do jogo, apontaria o Village como uma das melhores entradas na série. Com uns puzzles e bosses mais memoráveis, e com um acto final mais curto, ter-lhe-ia atribuído uma nota de 8.5 em 10 sem muitos problemas, mas como a experiência que é agora, acho um 7.5 em 10 a nota mais justa.
Resident Evil Village no OpenCritic