Final Fantasy VII Remake – Análise

Depois de anos e anos dos fãs a pedirem um remake, Final Fantasy VII – facilmente um dos JRPGs mais populares no ocidente – recebe o tratamento que muitos acham que merece. Lançado exclusivamente para a PlayStation 4, Final Fantasy VII Remake é a primeira parte desta “re-imaginação” do clássico da PSOne.

Antes de começar a análise, sinto-me obrigado a partilhar a minha experiência com a série Final Fantasy. Nunca fui grande fã da franquia da Square Enix, não cresci com esses jogos e apenas joguei o Final Fantasy VI, Final Fantasy VII Crisis Core e Final Fantasy XIII, nunca tendo acabado qualquer um deles, não por achar os jogos maus, apenas por falta de interesse em relação a outros jogos. Portanto, não tendo jogado o Final Fantasy VII original, apenas tenho um conhecimento superficial da história e gameplay do mesmo. Visto que não tenho um termo de comparação viável nem uma ligação nostálgica ao jogo, irei fazer esta análise com base sobretudo na experiência individual deste jogo. Posso fazer comparações ao original, mas irei ter apenas esta entrada em consideração na classificação. Caso procurem uma análise feita por alguém que tenha jogado o original, aponto-vos aos artigos dos meus colegas na Squared Potato e Meus Jogos.

Esta análise foi feita com base numa cópia fornecida pela Ecoplay, à qual agradecemos gentilmente.

A Narrativa

Não vou entrar no campo de spoilers, já que, embora isto seja um remake dum jogo com mais de 20 anos, Tetsuya Nomura toma bastantes liberdades com o enredo, fazendo adições e alterações (algumas pareceram-me bastante drásticas) aos eventos do original, especialmente perto do final. Portanto, quem estava à espera de uma recriação fiel ao original, pode ficar desiludido.

Cloud Strife é um antigo SOLDIER da Shinra que se junta a um grupo de eco-terroristas chamado AVALANCHE para combater a Shinra Corporation, uma companhia elétrica que está a drenar a vida do planeta. As personagens memoráveis de Final Fantasy VII estão todas aqui, e nota-se um desenvolvimento das personagens principais ao longo do jogo, especialmente no Cloud e Barret onde notamos a tensão entre ambos a desvanecer ao longo do jogo, e no caso do Cloud, vai largando aos poucos a personalidade mais reservada que demonstra inicialmente. Contudo, custa-me dizer que o desenvolvimento é bem executado, devido à escrita fraca do jogo. Quando os personagens não estão a cuspir one-liners secas constantemente, estão a ter diálogos superficiais e/ou expositivos, por exemplo, o Barret a dar um sermão ridículo e exagerado sobre o planeta nos capítulos iniciais do jogo. Há uma clara falta de subtileza na escrita que faria milagres à narrativa. Com a tecnologia atual, não há necessidade nenhuma de fazer personagens como o Barret gritar exatamente o que sentem, quando podiam simplesmente mostrá-lo. Surpreendentemente, acabei por gostar mais da química entre a Tifa e Aerith, que do resto.

Independentemente da qualidade da escrita em si, o enredo entreteu-me, os plot points são apresentados a um bom ritmo, havendo um equilíbrio agradável entre cutscenes e gameplay, e a estrutura não sofreu com a divisão da história em partes. Por volta dos últimos capítulos, há uma quebra que magoa este ritmo com demasiada exposição e cutscenes, e é honestamente a pior parte do jogo. Felizmente, não dura até ao final. A conclusão toma um rumo peculiar que acabou por me deixar bastante curioso para as futuras partes.

Já as side quests não têm qualquer apoio narrativo, são apenas conteúdo extra, filler para aumentar a longevidade do jogo, resumindo-se a fetch quests e combates contra inimigos normais, mas mais poderosos, ou o raro boss. Não são envolventes, nem são o melhor conteúdo extra que este jogo tem para oferecer, e apenas compensam pelo combate.

Som

No que toca ao voice acting, é difícil recomendar a versão inglesa. Joguei as primeiras 10 horas com as vozes inglesas e depois de mudar para as japonesas, não voltei atrás. A dobragem inglesa na maioria das personagens é decente no máximo, o Barret é insuportável, e, lembra-me das dobragens baratas de animes onde não há charme nenhum. A dobragem japonesa acaba por tomar um rumo menos sério, que no fim resulta melhor com o tom mais cómico de vários momentos da história principal e conteúdo opcional, embora a entrega dos actores nos momentos sérios e emocionais pareça exagerada, que já é típico das dobragens nipónicas.

Adorei a banda sonora, os momentos calmos e emocionantes beneficiam imenso das músicas que os acompanham, mas onde a soundtrack brilha mesmo, é nos combates contra bosses. Nada me motivava mais que o som bombástico das músicas de batalha (exemplo do Airbuster e Lay Down Some Rubber) acompanhados pelos efeitos sonoros da espada do Cloud a golpear os monstros um a um enquanto o Barret desfazia-os de longe com as balas e explosões da sua minigun. E a OST é sem dúvida, tanto em conjunto com os restantes elementos do jogo, como por si só, memorável. O restante trabalho de som está bem feito, e não tive queixas.

Visuais

Final Fantasy VII Remake consegue ser incrível. Os modelos dos personagens principais estão excelentes, com um bom trabalho de texturas na roupa, e as armas, sobretudo as espadas do Cloud, são notavelmente detalhadas. As animações também surpreendem no geral, embora haja um certo exagero na linguagem gestual dos personagens, provavelmente pela influência da animação e cultura japonesa. Midgar é estonteante; esta megapolis metálica tem uma divisão social demarcada pelos slums onde a pobreza e a fome sobrecarregam os menos privilegiados. As suas ruas são lamacentas, estreitas e sobrepovoadas. As casas minúsculas que lutam umas contra as outras pelo espaço; crianças, inocentemente, brincam na lama e dançam em cima dos telhados, respirando o ar poluído pelas obras colossais criadas pela industrialização e o poder de Shinra que cobrem o chão, paredes e o céu de ferro e aço; nesse céu artificial está a camada superior de Midgar, onde se encontram a classe média e alta da cidade onde, ao contrário dos slums, os residentes têm espaço e condições saudáveis. Conseguiram executar uma narrativa visual com o contraste do infortúnio da plebe nos bairros e o poder e estatura de Shinra que se centra em Midgar cobrindo toda a cidade com as suas obras artificiais.

Infelizmente, o trabalho nas texturas dos objectos e ambiente é horrível. Várias paredes, portas, rochas e mais têm aspecto de texturas de duas gerações atrás, ou que ficaram presas em loading. Em vários momentos também se notou que o fundo dos mapas era apenas uma imagem, e isso é recorrente em jogos e não costuma ser um problema, mas o estúdio fez um trabalho tão pobre em disfarçar o mesmo que é impossível não notar. Numa parte do jogo onde podemos ver os slums a vários metros do chão, é tão claro que é uma imagem 2D que acaba por ser hilariante. Por último, a rendering distance do jogo é muito baixa em certas zonas, nos slums do Sector 7 por exemplo, os NPCs surgiam do ar enquanto caminhava pelas ruas. É provavelmente um sacrifício para a performance, onde tive 30 fps constantes e não notava quedas, mesmo durante os combates mais intensos.

Gameplay

Passando agora ao gameplay. Final Fantasy VII Remake larga o combate por turnos do original pelo combate em tempo real com um sistema ATB. Resumidamente, enquanto combatem, as barras de ATB vão enchendo, ao ter uma barra cheia, podem utilizar uma habilidade, item ou spell em combate. Como RPG é de esperar haver níveis, equipamento e armas diferentes. Cada arma traz uma habilidade única, mas se maximizarem a sua proficiência, podem utilizar essa habilidade com qualquer outra arma, isto, em conjunto com o sistema de melhoria de armas (podem usar pontos para melhorar os stats ou adicionar passivas às vossas armas), faz com que nenhuma delas se torne irrelevante, cada arma tem as suas forças e fraquezas e cabe-vos decidir qual mais se adapta ao vosso estilo de jogo. No meu caso, dependi bastante da Buster Sword e a Hardedge porque gostava de usar algo mais equilibrado ou focado em ataque com o Cloud; com o Barret, utilizava as armas com melhor defesa, e usava a Aerith como suporte; a Tifa era a maior hard hitter da minha party. A materia, itens especiais para equipar às armas, oferecem spells, habilidades, passivas e outros tipos de melhorias. A variedade de materia é bem vinda e há uma certa profundidade na sua sinergia. Quando melhorava as minhas armas gostava de sempre de desbloquear mais espaços para a materia só para ter mais opções em combate e explorar o que poderia fazer com elas.

O combate em si é o meu aspecto favorito do jogo. Ao início já era divertido utilizar as habilidades e spells (em adição, cada personagem tem uma habilidade única que é usada com o triângulo), descobrir as fraquezas dos inimigos para poder atordoar os inimigos (todos os inimigos têm uma barra de “stagger” que enche dependendo da sua fraqueza, ao chegar ao máximo, os inimigos ficam atordoados e recebem muito mais dano). Mas ao longo do jogo fui descobrindo sinergias e combos que o jogo não nos diz logo ao início. No caso do Cloud, a habilidade única dele é trocar entre modos de ataque, Operator e Punisher, o Punisher é mais poderoso e tem um contra ataque, mas também torna o Cloud mais lento no fim dum combo e não pode bloquear ataques. No entanto, podem alternar entre estes dois modos entre ataques com o timing certo, reduzindo o tempo em que o Cloud fica exposto, prolongando o combo e maximizando o dano oferecido. No caso do Barret, a habilidade única dele precisa de ser recarregada com o triângulo, uma acção que o deixa exposto durante uns segundos, mas podem aproveitar a “explosão” no fim do seu combo para recarregar a habilidade mais rapidamente. Com a Tifa, por exemplo, há vários combos entre habilidades que podem executar, por exemplo, seguir um uppercut com um divekick. Juntem isto à materia, e têm uma grande variedade de opções em combate. Por fim, também têm acesso a Limits e Summons em combate. Os Limits são ataques extremamente poderosos que carregam lentamente (podem carregá-los mais rapidamente se atordoarem os inimigos frequentemente), e os Summons invocam familiares para vos ajudar em campo. Ambos têm animações impressionantes e são uma boa ajuda, infelizmente, gostava que pudessem desbloquear mais durante a playthrough normal. Há apenas 5 Summons e 2 Limits por personagem até acabarem jogo uma vez. O único problema que tive com o combate foi o ocasional mau ângulo da câmara.

Graças ao combate divertido, as Colosseum battles (batalhas em sequência para desbloquear itens), VR Battles (onde lutam contra os summons para os desbloquear) e as lutas contra os bosses foram as minhas partes favoritas do jogo. Há alguns mini jogos, mas não achei nenhum deles divertido, apenas fi-los pelas recompensas ou para avançar a história. Os mini jogos dos pull-ups então foram apenas frustrantes.

Level design

As zonas do jogo são todas pequenas e lineares, gostava que o estúdio tivesse tomado uma filosofia de level design aberto, com mais acesso a exploração. Um ou dois níveis têm caminhos opcionais para encontrar itens, porém são apenas desvios de alguns segundos. Fiquei desiludido com a pequena quantidade de zonas que podemos explorar em Midgar, que se resumem pouco mais de dois sectores, umas zonas subterrâneas e edifícios da Shinra. Há também uma boa quantidade de tempo perdida em saltar entre plataformas ou esgueirar entre pequenos aberturas nos mapas porque não há botão para saltar e temos de assistir às mesmas animações lentas de movimento.


Duas pequenas observações…

Acabei o jogo com cerca de 35 horas, fiz tudo o que me ofereceu até ao epílogo. Joguei em Normal, não senti que houvesse grande desafio ao longo do jogo. Depois de acabarem a história principal desbloqueiam o modo Hard, onde não podem usar itens e o vosso MP não recupera em rest points. A maior diferença que senti no modo Hard foi o dano que recebo, mas do que joguei, achei pouco mais difícil que o Normal.

Devo abordar a questão da divisão do jogo em partes. Senti que, como experiência individual, principalmente não tendo jogado o original, Final Fantasy VII Remake soube a um jogo completo, tanto em estrutura narrativa como conteúdo. Contudo, está longe de ser um jogo grande.


Conclusão

Final Fantasy VII Remake como título individual é um bom jogo. O combate é extremamente divertido e a banda sonora é fantástica. Superficialmente, é lindo, mas acaba por ter vários problemas visuais. E a narrativa, embora entretenha, peca pela má escrita e execução. Andei às voltas com que nota devia atribuir ao jogo, porque o combate carrega tudo o resto e tenho pena que FFVIIR tenha os problemas que mencionei, vejo-me a voltar ao jogo só para fazer umas batalhas no coliseu e contra bosses, mas para já, fico-me pelo 7.5 em 10, se entretanto receber actualizações que melhorem pelo menos alguns dos aspectos, ficarei feliz para voltar e subir-lhe a nota. Sinto que parte da sua qualidade irá depender das próximas entradas, mas até lá, assim fica. É uma recomendação fácil aos fãs do género, mesmo a 60€. Para os jogadores mais casuais, se jogaram a demo e gostaram do combate, ou mesmo se forem como eu, que nunca senti grande interesse em Final Fantasy, então dêem uma oportunidade ao jogo e podem sair surpreendidos.


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