Ghost of Tsushima – Análise

Três anos após a revelação de Ghost of Tsushima no Paris Games Week, o jogo da Sucker Punch Productions – o estúdio subsidiário da Sony que criou a série Sly Cooper e InFamous – finalmente foi lançado exclusivamente para a PlayStation 4, sendo o último grande exclusivo da consola até ao lançamento da PlayStation 5 no final deste ano.

Ghost of Tsushima é um jogo de acção e aventura em terceira pessoa num mundo aberto. O jogo conta a história de Jin Sakai, um samurai durante a invasão Mongol em 1274 na ilha de Tsushima. O título está disponível apenas para a PlayStation 4 por 69.99€. Agradeço à Sony por nos ter fornecido um código do jogo para esta análise.

A narrativa

Vou começar pelo elemento que acho ser o mais fraco durante a minha playthrough. Como já escrevi em cima, a história de Ghost of Tsushima segue Jin Sakai, o samurai líder do clã Sakai que testemunha a morte da maior parte dos seus aliados durante a invasão mongol. Jin consegue sobreviver à batalha inicial, e, encontra-se em desvantagem na ilha de Tsushima que está agora ocupada pelo inimigo e o seu tio, Lord Shimura, capturado. Jin tenta resgatar o seu tio para salvar Tsushima e derrotar Khotun Khan, custe o que custar.

Jin Sakai passou grande parte da sua infância com o seu tio e fora ensinado pelo mesmo a ser um samurai que se mantém fiel a um código de honra. Durante a história de Ghost of Tsushima, o protagonista vê-se a descartar os seus valores e princípios para derrotar os seus inimigos. A narrativa acaba por levantar a questão de “os fins justificam os meios?” várias vezes e as acções de Jin põem em causa não só o estatuto e credibilidade dos samurai como as vidas dos seus amigos. Esta é a temática da narrativa que o jogo melhor explora, com um constante foco no mesmo durante a main quest e na transição de Jin de um Samurai para o “Ghost” que aterroriza os mongóis. Há um grande número de side quests que desvendam o mundo de Tsushima e/ou desenvolvem várias personagens secundárias. Os contos destas personagens são separados em cerca de 8 ou 9 partes e conseguem estar ao nível da história principal em vez de saberem a “filler“, ao contrário de algumas side quests individuais que vão encontrando pelo mundo. Ghost of Tsushima não tenta esconder a miséria e crueldade do seu mundo, somos constantemente lembrados da morte, injustiça e pobreza que o povo sofre tanto à mão dos mongóis, como por vezes, à mão dos samurai. Ainda assim, apesar de alguns bons momentos que realçavam a impiedade e implacabilidade a crescer dentro de Jin, e as sequências finais do jogo, não achei a história de Ghost of Tsushima particularmente memorável. Os diálogos eram na maior parte “secos” e sou da opinião que os personagens importantes, como a Lady Masako e o Sensei Ishikawa que tinham várias side quests focadas neles foram pouco relevantes nas main quests e pouco fizeram para além de “estarem lá”.

Visuais

Desde as planícies cobertas de flores a dançar ao vento, às enormes montanhas com vista para toda a ilha, o mundo de Ghost of Tsushima não parou de me deslumbrar com as suas paisagens, cada uma digna de um wallpaper, perdi conta à quantidade de vezes que parei para ligar o photo mode e tirar umas fotos do jogo. Uma das minhas partes favoritas do jogo foi apenas viajar pelo mapa e inspirar a vida que o mundo transmitia graças à mistura da sua palete de cores variada e viva, os animais que a habitavam e o vento a soprar pelos campos de flores e árvores. Para além de estonteante, a direcção artística da ilha de Tsushima guia o jogador através de referências visuais (e sonoras) de forma orgânica e imersiva e leva-nos a explorar o mapa sem a necessidade de ícones ou waypoints. Quando digo isto, nem me refiro ao vento, que sopra na direcção do vosso objectivo, mas sim às zonas e edifícios espalhados pela ilha, ou certos elementos, que se destacam imediatamente do resto da paisagem. Por exemplo, uma árvore rodeada por pirilampos é uma toca de uma raposa, um portão Torii aponta-te o caminho para um templo, e fumo costuma ser sinal para uma quest. Em adição a isto, podem encontrar um pássaro dourado pelo mapa, se o seguirem, ele levar-vos-á a um segredo da ilha. Existem tantas referências e sinais visuais no mundo que durante grande parte da minha playthrough nem utilizei o mapa para explorar, e guiei-me apenas pelo que via, e quando não conseguia encontrar nada nas proximidades, subia à montanha mais próxima para ter uma visão mais clara do mundo.

Infelizmente, os modelos das personagens e animações não estão à mesma altura do mundo. As animações faciais são no geral demasiado “tensas” e pouco expressivas, lembra-me de Horizon Zero Dawn, por exemplo. A iluminação também não faz muito para melhorar o aspecto dos personagens e ter passado do The Last of Us Part II – que fez um trabalho fantástico com iluminação e sombras para reforçar o realismo dos modelos das personagens – para isto fez com que eu notasse ainda mais nos visuais dos humanos. Claro que é falacioso estar a comparar dois jogos diferentes, não obstante, achei o Ghost of Tsushima desapontante neste aspecto específico.

O bom aspecto dos modelos das personagens (do Jin, neste caso) é a customização, o Jin tem imensas armaduras, máscaras e chapéus com várias cores cada uma para personalizarem à vossa vontade. Cada armadura tem habilidades especiais mas tirando uma ou duas, pouca atenção lhes dei.

Têm a opção de jogar em “Kurosawa Mode“, com um filtro de imagem a preto e branco e uma qualidade de som “vintage“, inspirado no lendário realizador japonês, Akira Kurosawa. Mas recomendo escolherem o modo padrão na vossa primeira playthrough porque as cores têm um papel importantíssimo na direcção de arte.

Utilizando uma PlayStation 4 normal, notei algumas quedas de frames, mas nada que afectasse a minha experiência, e o jogo, na maior parte, corre bem na consola. Os loading times são extraordinariamente rápidos para um jogo deste tamanho.

Som

O sound design de Ghost of Tsushima não é de nenhuma forma brilhante, mas faz o que é necessário para dar feedback ao jogador e credibilidade ao mundo. Enquanto galopam pelo mundo de cavalo conseguem ouvir os pássaros a cantar e o vento a soprar pelos campos gigantes de Tsushima, de vez enquanto somos alertados pelo piar do pássaro dourado que nos quer levar a um segredo na ilha, ou pela discussão de soldados mongóis a vigiar a estrada ou a combater um animal selvagem. No que toca ao stealth, o som deixa a desejar e mal consegui usá-lo para perseguir os inimigos, tendo dependido apenas do ecrã. No entanto, em combate é mais útil já que conseguem antecipar as flechas inimigas estando atentos aos alertas dos mesmos e os efeitos sonoros da katana em combate são bastante satisfatórios. O voice acting inglês é decente no geral e os actores principais têm uma performance convincente embora nada se tenha destacado durante toda a minha playthrough e duvido que alguma delas se mantenha na minha memória durante muito tempo. O voice acting Japonês traz mais intensidade e emoção ao jogo, mas em contrapartida, o mau lip sync pode incomodar alguns jogadores, se não é o vosso caso, até aconselho a jogarem com o diálogo japonês. A dobragem portuguesa é inferior a estas duas e a entrega dos actores de voz deixa a desejar, mas não deixa de ser uma boa alternativa para quem tiver dificuldades com línguas estrangeiras, ou para quem simplesmente preferir jogar em português.

A soundtrack faz um bom trabalho em acompanhar o jogo, mas há alguns momentos na narrativa ou até mesmo durante a exploração que são elevados pela banda sonora graças ao trabalho de IIan Eshkeri e Shigeru Umebayashi. Deixo o exemplo da música utilizada numa das sequências do prólogo, Jin Sakai. A composição e uso de instrumentos tradicionais em músicas como A Reckoning in Blood e The Way of the Samurai seguem a jornada épica de Jin e enfatizam o tom do mundo onde este vive.

Gameplay

Ghost of Tsushima é o vosso típico Open World com um número limitado de actividades a realizar repetidamente pelo mapa. Contudo, a execução do mesmo eleva-o acima da generalidade dos jogos AAA dentro do género pelas pequenas coisas que a Sucker Punch adicionou ou mudou. Em primeiro lugar – e isto acontece-me muitas vezes em jogos Open World – em nenhuma altura do jogo me senti sobrecarregado com objectivos, actividades ou marcadores no mapa. O mapa vai-se relevando consoante as áreas que exploram e não há qualquer tipo de “Ubisoft Towers” que são obrigados a subir para revelarem uma região no mapa. Em vez disso, podemos ir explorando e fazendo actividades gradualmente, e perto do fim dum acto, a região será revelada assim que libertarem todos os postos inimigos para poderem realizar as actividades que falharam por acaso. Onde me diverti mais com o Ghost of Tsushima, foi em não utilizar o mapa nem o vento, e apenas me guiei pelo que via à minha volta e descobria actividades e localizações por mim próprio. Todavia, as actividades em si podem tornar-se aborrecidas mais tarde pela sua natureza repetitiva, já que há um pequeno número de actividades e coleccionáveis diferentes que se repetem num loop. Tal como em jogos como o Spider-Man, Horizon Zero Dawn, Assassin’s Creed, etc, acaba por ser um aspecto que pode incomodar certos jogadores e agradar a outros. Ainda dentro do tema de exploração, deixo apenas a observação que escalar montanhas e montes é um pouco aborrecido por ser tudo automático e não há praticamente nenhuma interacção por parte do jogador para além de apontar a direcção e usar o grappling hook ocasionalmente.

O combate é simples mas divertido. Joguei na dificuldade difícil e não achei o jogo muito desafiante mas ainda teve uns momentos excitantes, lutar contra os inimigos trocando entre as stances (cada stance é eficaz contra um tipo específico de inimigo) e conseguindo os parries perfeitos é o auge do combate e honestamente, pouco usei as ferramentas do Ghost (kunais, bombas…) que vão desbloqueando durante o jogo porque poucas vezes sentia necessidade de as utilizar e tornavam o combate demasiado fácil. Os duelos contra bosses são também bons momentos para testarem a vossa habilidade no jogo e provocando algumas das secções mais estimulantes da aventura. No que toca a combates contra grupos, o AI é muito fraco, onde muitas vezes têm arqueiros a disparar contra a parede ou inimigos a andar calmamente dentro de um acampamento em alerta enquanto os seus amigos estão ser mortos a torto e direito pelo Jin, e é uma das razões pela qual o stealth é enfadonho. Cheguei a jogar um pouco com a dificuldade Lethal, que foi adicionada numa actualização, nesta dificuldade morrem num só golpe, por isso não é aconselhável a escolher na primeira jogada, mas é um bom desafio a quem gosta do combate.

Cheguei a recorrer ao stealth algumas vezes porque o jogo o pedia através de missões específicas ou objectivos secundários, ou simplesmente para variar, mas raramente foi gratificante, e serve apenas para facilitar o jogo, de tão superficial que é. Podem distrair os inimigos e assassiná-los de perto ou utilizar o vosso arco para os matar de longe. Por mais barulho que façam, parece que os mongóis não querem saber se não for um som de um pequeno sino ou um petardo. Eles reagem a corpos mortos que podem usar para atraí-los e matá-los, mas a única inteligência que vi dos inimigos foi quando investigavam o acampamento em pares de costas um para o outro, uma estratégia que se prova pouco eficiente a partir do momento em que desbloqueiam a habilidade de assassinar vários inimigos duma vez. Adicionando a isto, o jogo oferece a típica “Eagle Vision” (Focused Hearing neste caso) para poderem ver os inimigos pelas paredes, que achei completamente desnecessário e nem a usei.

Tive alguns problemas com a câmara, especialmente em zonas fechadas. Não há qualquer tipo de lock-on ou câmara dinâmica durante os combates por isso têm de estar activamente a controlar a sua posição enquanto combatem, e em zonas fechadas ou densas, encontrei-me frequentemente a lutar contra a câmara para conseguir ver-me e aos inimigos.

Em termos de personalização, como falei em cima, o Jin tem várias armaduras com habilidades únicas, embora pouco relevantes. Podem melhorar as armaduras, arcos e katana nos acampamentos em troca de recursos. E têm acesso a Charms, coleccionáveis que encontram pelo mapa ou recebem como recompensa de quests que oferecem melhorias e habilidades ao Jin, desde dano e vida extra a certas a equipamentos específicos.

Devo mencionar também os Mythic Tales, quests especiais que desbloqueiam habilidades, armaduras ou equipamento especial e acabaram por ser as minhas quests favoritas por causa da exploração. Pois em vez de apenas seguirem o vento para o próximo objectivo, nestas quests tinham de seguir pistas ou imagens/pinturas para encontrar localizações específicas, e tenho pena que o jogo não tenha aproveitado a sua direcção de arte magnífica para criar mais deste tipo de missões.

Antes da conclusão quero ainda destacar o Photo Mode do jogo, que é dos melhores que já utilizei. Tem imensas opções para filtros, podem escolher a hora do dia, a direcção e intensidade do vento e ainda podem fazer planos de sequência e muito mais.

Concluindo

Ghost of Tsushima mantém-se dentro da fórmula do típico jogo AAA com mundo aberto. Mas as pequenas mudanças e melhorias tornaram-no bem mais agradável que outros jogos dentro do género que joguei recentemente. O combate é satisfatório, ao contrário do stealth. E o jogo conta com um dos mundos mais lindíssimos que já vi, e onde tirei imenso prazer em explorar. O jogo não tem um contador de horas implementado, mas estimo que tenha posto mais de 60 no mesmo até à platina, e tendo em conta a minha experiência, atribuo-lhe com uma nota de 7.5 em 10. Tendo em conta a quantidade de horas que o jogo oferece, é uma recomendação fácil a quem é fã do género. Para os jogadores que procuram algo menos formulaico e que se diferencie mais, Ghost of Tsushima não é o jogo certo. Mas se o comprarem em desconto, será divertido independentemente do quanto arrisca.

Ghost of Tsushima no OpenCritic


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