Death Stranding 2: On the Beach – Entrega com (demasiada) segurança (Análise)

Há uns meses atrás revisitei o Death Stranding (Director’s Cut) no PC em antecipação à sequela e, para surpresa minha, acabei não só por gostar mais do jogo do que esperava passados 6 anos, como até fiz a “Platina” do jogo em 80 e poucas horas. Não é que as minhas queixas originais tenham desaparecido, mas levou-me a testar mais mecânicas e ferramentas do jogo que a história principal não requer de nós e vi o potencial do jogo em ação mais facilmente em algumas das sub-orders.

Este potencial da jogabilidade do Death Stranding era uma das coisas que mais me entusiasmava para a sequela, pelas previews que via e lia online, o jogo prometia. Contudo, a sequela acabou por tomar uma direção diferente do que esperava, e apesar de ter saído de Death Stranding 2 com a opinião que foi um bom jogo, não me consigo livrar deste sentimento de insatisfação com as decisões em relação ao loop de gameplay e a sua “casualização”.

Vamos dar um passo atrás primeiro, e abordar o elemento dos jogos do Kojima que sistematicamente causam sentimentos mistos na minha cabeça: a narrativa.

Sam, a viver são e confortável com Lou, é visitado pela Fragile e convencido (ou forçado) a voltar à vida de porter e conectar o México à rede Quiral, servindo como uma espécie de tutorial ou refamiliarização com os sistemas do jogo, rapidamente conectamos o México, contudo, o que seria uma breve aventura leva a uma grotesca reviravolta na história e Sam vê-se, chocado e traumatizado, a conectar toda a Austrália à rede.

Obviamente esta curta sinopse é assim escrita para evitar o campo de spoilers (coisas importantes acontecem logo nos primeiros capítulos do jogo), mas a narrativa em si tem alguns momentos e pedaços de personalidade que gostei bastante. Não acho que seja uma opinião controversa que as narrativas do Kojima são muito mais interessantes quando ele exagera na sua peculiaridade e bizarrias com aquela boa pitada de comentário político e social. E não falta disso em Death Stranding 2, contudo, os problemas que mancham os jogos anteriores dele continuam presentes em força aqui.

Hideo Kojima comete o clássico erro de contar todos os detalhes que pode através de diálogo expositivo medíocre (com momentos especialmente maus) ou longos e aborrecidos monólogos. Muito do que ouvem das personagens é desnecessário e podia ter sido (em alguns casos até foi) mostrado em cutscenes ou gameplay. Esta necessidade de vomitar discursos de informação ao jogador acaba por nem fazer sentido para a narrativa.

Porque é que o parágrafo em cima tem o formato duma citação? Porque foi um pedaço de texto que eu escrevi sobre Death Stranding na minha análise ao jogo. E embora eu desgoste de revisitar análises antigas minhas, acho que este pedaço ainda se aplica perfeitamente aos problemas de escrita da sequela. Continuamos com o diálogo expositivo e desnecessário, felizmente, há um “Corpus” no jogo, uma enciclopédia consultável a qualquer altura que contém informação sobre o enredo, conceitos e personagens que, sinto eu, reduziu alguma da quantidade de exposição da história (pelo menos, na primeira metade do jogo). Há também algum tratamento e caracterização de personagens questionável, não da mesma forma que Kojima, historicamente, tratou personagens femininas (olá Quiet), mas de situações em que, intencionalmente ou não, retratam alguém de certa forma que vai contra as suas ações. Teria de entrar em spoilers para desenvolver esta minha queixa, mas fica a observação que torci o nariz mais do que um par de vezes com algumas interações ou decisões narrativas.

Negatividade à parte, a performance dos actores é tão boa como o seu antecessor, o Norman Reedus como protagonista até nem se destaca dos colegas, mas a Léa Seydoux tem excelentes momentos no papel de Fragile, o Troy Baker continua a ser um vilão detestável (no bom sentido) e gostei da estreia da Elle Fanning num videojogo.

De qualquer forma, as minhas fichas foram apostadas nas melhorias do gameplay, não da história, e mesmo assim, não sei se saí a ganhar…

Death Stranding 2 não demorou muito para me deslumbrar, a sequência inicial onde Sam se levanta para revelar uma zona montanhosa que se alastra para além do nosso campo de visão é incrível, estava boquiaberto com o nível de detalhe e o nível de fidelidade que espiava à distância, a banda sonora de Woodkid acompanha-nos dinamicamente enquanto atravessamos os cumes e valas a caminho da casa de Sam.

Assim que comecei a aventura para atravessar a fronteira com o México, fui surpreendido com uma tempestade de areia à distância, enquanto fazia o meu trecho pelo deserto a tempestade aproximava-se assustadoramente e eventualmente fui engolido pela areia e lá segui o caminho por entre o nevoeiro vermelho.

Momentos como este, onde o próprio mundo nos enfrenta diretamente são raros em Death Stranding 2 (ou pelo menos, foram raros nas minhas 70 horas pelo jogo). Por um lado, é pena não acontecerem muitas vezes, acho que em 70 horas não apanhei todos os tipos de eventos da natureza e muitos apanhei apenas uma vez, por outro, esta raridade também os torna mais especiais, e dão ao jogo algo que este precisa muito: obstáculos.

O jogo vai perdendo um bocado da magia passado algumas horas, durante as minhas entregas pela Austrália, havia uma constante: a carrinha ia comigo para todo o lado. Porquê? Era fácil de manobrar, carregava muitas encomendas ao mesmo tempo, e o mundo não está construído para impedir o abuso destes veículos. Onde o primeiro Death Stranding tinha abrigos um pouco mais complicados de alcançar, como o Musician que estava por cima duma cascata, ou o The Collector escondido num desfiladeiro, forçando-nos assim a usar ferramentas como as escadas, cordas e ziplines para os alcançar. Death Stranding 2 facilita este acesso em troca de mais grind. São precisas mais entregas para ganhar as recompensas dos preppers, mas são mais fáceis de alcançar. Detesto este rumo, e preferia que o mundo estivesse construído de forma a exigir mais criatividade por parte do jogador, com o arsenal extenso de ferramentas que temos ao nosso dispor.

O combate também foi melhorado, incluindo armas adicionais, uma nova flexibilidade ao Sam, uma maior variedade em inimigos e bosses, e o combate tem mais ênfase neste jogo. É pena, porque é o aspecto de Death Stranding que menos me interessa. Ainda testei algumas estratégias de combate mas nenhuma bate a eficácia de simplesmente me armar em Sam Rambo com uma metralhadora e livrar-me de todos os inimigos à minha frente. Não minto que senti algumas familiaridades com Metal Gear Solid V, mas nunca ia chegar ao mesmo nível de versatilidade e execução de gameplay furtivo (e não acredito que estivesse a tentar isso).

Reservo alguns elogios para os controlos e movimento, são super responsivos e intuitivos, ao ponto de quando fazemos asneiras, não temos nada para culpar exceto nós próprios, até quando espetamos a carrinha contra uma árvore e partimos metade das encomendas lá dentro, é porque não fomos cuidadosos. E se o Sam tropeça e se espalha pelo chão fora, é porque fomos gananciosos e levámos encomendas a mais nas costas.

Também não deixa de ser satisfatório ver o nosso trabalho a dar frutos, as estradas requerem esforço para construir, mas assim que estiverem a conduzir em cima duma, em vez de estarem aos solavancos pela terra, agradecem o facto de terem investido tempo na construção. Assim como, quando veem uma boa ponte vossa a receber centenas de likes, ou duas ziplines na posição perfeita para subir a montanha.

As 80 horas que investi em Death Stranding 2 passaram-se bem, ainda que tenha muito pouca vontade de lá voltar neste momento, e o grind aborrecido forçou-me a desistir da Platina. Não obstante, saio de lá com reservas sobre o produto final, com uma amargura em relação ao quão seguro foi, queria algo mais arriscado e mais desconfortável em termos de jogabilidade. Algo que puxasse pela criatividade em vez de apelar ao relaxamento. Talvez tenha ido com expectativas erradas?

Não vou deixar de o recomendar para os fãs do primeiro jogo, é uma boa obra que faz coisas boas, e continua a ser um dos jogos AAA mais diferentes que encontram hoje em dia. Atribuo um 7 em 10.

Leave a comment